Primeira aparição da música francesa, outro riquíssimo veio artístico, infelizmente em rápida perda de exposição por terras lusas, pois, apesar dos esforços aos mais altos níveis das autoridades francesas, a vaga anglo-americana submerge quase tudo.
Se o presente não é brilhante - apesar de, por exemplo, a língua francesa se ter adaptado maravilhosamente ao rap e ao hip hop e ter imensas interacções com a música da África Ocidental e caribenha -, regressemos ao passado. E a uma música que a minha professora de Francês do 10º ano (muito obrigado, "setora" de que não me lembro nome nem face, mas de que nunca esqueci a canção) nos fez ouvir e reflectir. Chama-se Le deserteur - O desertor -, foi escrita em 1954 pelo artista completo Boris Vian (escritor, compositor, poeta, cantor, instrumentista), e é um dos mais duradouros hinos à paz, ou melhor, contra a guerra. A letra é magistral, de uma simplicidade de termos perfeitamente oposta à magnitude de ideias e sentimentos. Uma declaração sincopada, assente em rimas claras no "ére", no "ombe", no "irer", no "ent", do Monsieur Le President. O presidente da República Francesa, que mandava o narrador apresentar-se, até ao meio-dia da quarta-feira seguinte, no quartel para seguir para a guerra. E o resto é a explicação por que não vai para a guerra, que não está sobre este terra para matar pobres pessoas, e que se é para ir para a guerra, então que vá o presidente, que está em boa forma para isso. Quase parece uma canção de ninar... Nos 60 anos que passaram desde que Vian compôs Le deserteur, as guerras não desapareceram, nem diminuíram. E quantas professoras de Francês irão neste ano lectivo apresentar esta pérola aos seus alunos? E.M.
Boris Vian, Le deserteur (1955)